quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Questão de Química

- Oi, eu tenho uma coisa pra te mostrar.
- Hum, o que é?
- Uma coisinha que eu escrevi.
- Tudo bem, então.

"Sei que nós dois atingimos o nosso ponto de saturação, que já começava a se formar um certo corpo de fundo dentro da gente, de tantas precipitações minhas e tuas..."

- Ana, que diabo é isso?
- Ué, tô tentando falar a tua língua. Cansei de jogar indiretas, metáforas, alegorias, finas ironias, paródias, cansei de apelar pra tua sinestesia. É óbvio que tu não compreendeu até agora. Quem sabe assim, quimicamente falando, tu entenda o que eu quero dizer. Continua, vai.

"Sei que nós dois atingimos nosso ponto de saturação, que já começava a se formar um certo corpo de fundo dentro da gente, de tantas precipitações minhas e tuas. Na época, tu achaste que o melhor seria neutralizar o que havia entre nós - como se as tuas palavras ácidas pudessem acabar com toda a positividade que tínhamos e rebaixar a zero o nosso ph de quase 14. Tudo bem, direito teu. O problema é que, dissociados, tu viraste um sólido branco e cristalino, pronto para dar sabor ao mundo, mas eu... eu virei água; dissolvendo tudo o que aparecia pelo caminho, inodora, incolor, insípida. Funcional, mas sem graça.
Quando a reação inorgânica acabou, todas as reações orgânicas do meu corpo entraram em colapso. Eu simplesmente não sei o que fazer sem o teu éster para dar cheiro e sabor ao meu dia. Quando foi que o nosso amor virou aldeído e volatilizou-se por aí? Eu vou vivendo isomericamente, mudando uma coisa aqui, outra ali, mas continuo sempre sentindo a mesma coisa, no final. A verdade é que sem a tua superfície de contato, as reações em mim simplesmente não ocorrem.
Vamos, me diga: o que eu faço se toda vez que eu te vejo o meu coração entra em ressonância e a minha mente gira mais que um anel de benzeno? Amor, sem você o meu orbital não fica completo, os spins ficam todos de cabeça para baixo e eu sou tomada por eletronegatividade. Nada está balanceado e tudo permanece com as suas respectivas proporções "devidamente" erradas. Sem você eu não tenho energia de ativação pra nada.
Passemos um solvente por sobre tudo isso, eu sei que a gente ainda se atrai, que as nossas ligações são do tipo sigma e que as pontes de hidrogênio que nos conectavam não ruíram. As coisas entre nós não oxidaram, querido. Só precisamos do catalisador certo para reavivar o calor da nossa reação, nossa antiga entalpia. O que me diz? Quer [re]viver esta experiência?

Um mol de beijos!"

- Hum... Bem, eu não sei o que dizer. Tu não odiava Química?
- E odeio. Mas te amo mais do que odeio ela.
- Ana, a verdade é que isso foi ridículo.
- Ridículo? Mas tu entendeu, não foi? Tá vendo o quanto TU é ridículo e o que tu me faz falar pra conseguir que tu me entenda? Eu não sei mais o que fazer, eu te amo, cara!
- Eu sei. E não quero que você faça mais nada. Digamos que os nossos reagentes já foram todos consumidos. Acabou, não sobrou nada, Ana. Quem não compreendeu até agora foi tu. Fica bem, te cuida. Boa noite.

Beijo na testa, "adeus". Heisenberg chegou bem perto de decifrar o amor: o eterno princípio da incerteza...

2 comentários:

  1. assim que aconteceu com 'marx', na época que ele era héte.. KK

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  2. Parabens pelo blog, virei seu fã. estou começando um novo blog www.concepcoesdeumamenteinsana.blogspot.com
    me adicione no msn para conversarmos: wanfrancas@hotmail.com

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